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Fafá de Belém completa 50 anos de carreira com identidade nacional e uma imagem amazônica que irradia alegria


Revelada em abril de 1975 na trilha sonora da novela ‘Gabriela’, cantora paraense tem obra situada entre o repertório regional e a canção sentimental do Brasil. Fafá de Belém

Mauricio Figalgo / Globo

♫ ANÁLISE

♪ No início dos anos 1980, Fafá de Belém ouviu de Roberto Menescal – então no posto de diretor artístico da gravadora Philips – que deveria voltar para Belém (PA) porque a carreira da cantora já dava sinais de exaustão.

Firme e forte, Maria de Fátima Palha de Figueiredo ignorou o conselho duro e seco do colega artista travestido de executivo da indústria fonográfica. Nunca deixou de visitar a amada cidade natal onde veio ao mundo em 9 de agosto de 1956, mas jamais voltou definitivamente para Belém (PA) para interromper carreira que, ao contrário dos prognósticos pessimistas de Menescal, continuou com vigor ao longo dos tempos, chegando aos 50 anos neste mês de abril de 2025.

Sim, Fafá de Belém completa 50 anos de carreira, iniciada em abril de 1975 quando a gravação do samba de roda Filho da Bahia (Walter Queiroz) começou a tocar na trilha sonora da novela Gabriela, exibida pela TV Globo com sucesso naquele ano de 1975.

Quem gravaria o samba era Maria Creuza, mas a artista baiana ficou doente e o produtor Roberto Sant’Ana – padrinho artístico de Fafá por ter descoberto, ainda em Belém (PA), a cantora então ainda em formação – sugeriu o nome da jovem paraense. O resto é história que será contada em biografia e musical de teatro.

A partir de 1976, no embalo do sucesso conquistado com a gravação do samba Filho da Bahia, Fafá pavimentou discografia que, nessa fase inicial, enfatizou a origem da cantora de Belém do Pará. Foi construída uma imagem regional, brejeira, que se afinou com o repertório de álbuns como Tamba tajá (1976), Água (1977) – a obra-prima desse momento nascente – e Banho de cheiro (1978).

A receptividade da gravação do bolero Sob medida (Chico Buarque) no álbum Estrela radiante (1979) – grande a ponto de abafar o registro simultâneo de Simone no lapidar disco Pedaços (1979) – sinalizou o caminho romântico que seria trilhado por Fafá na década de 1980. Até porque o álbum Crença (1980) apontou o desgaste comercial da fórmula regional.

Atenta aos sinais, Fafá percebeu o esgotamento e virou o disco com Essencial (1982), o último álbum da artista na gravadora Philips (em 1988, a cantora gravaria mais um, Sozinha, em outro momento da carreira). Mesmo com vendas modestas, o álbum Essencial legou uma das gravações mais pungentes da discografia da artista, a de Bilhete, canção de separação que Ivan Lins compusera – com versos do parceiro letrista Vitor Martins – e que lançara sem repercussão em 1980. Na voz passional de Fafá. Bilhete virou sucesso nacional como um dos temas principais da novela Sol de verão (1982 / 1983).

Na sequência, a cantora provou que, como executivo da indústria fonográfica, Roberto Menescal era mesmo um bom guitarrista e compositor. Encerrado o contrato com a Philips, Fafá foi para a gravadora Som Livre, onde de 1983 a 1987 seguiu a tendência das cantoras de MPB e pôs o pé no cancioneiro sentimental brasileiro, ampliando o sucesso e ecoando influências que absorvera ainda menina nos saraus e programas de rádio de Belém (BA).

Atrevida (1986) – disco do sucesso Memórias (Leonardo, 1986) – foi o marco comercial da guinada popular da cantora em movimento que conduziria a artista ao topo da popularidade com o álbum Fafá de 1989. Foi neste disco que, ao lado da dupla Chitãozinho & Xororó, a cantora apresentou a guarânia Nuvem de lágrimas (Paulo Debétio e Paulinho Rezende, 1989) em gravação que abriu as antenas das rádios FMs para a música sertaneja no Rio de Janeiro (RJ), cidade até então refratária ao gênero.

Cantora com aguçado tino comercial, Fafá apontou no já mencionado disco de 1986 o reinado nacional das lambadas. Em 1996, indicou outra tendência do mercado ao amplificar a toada amazônica Vermelho (Chico da Silva) no álbum Pássaro sonhador, disco que também rendeu o sucesso Abandonada (Michael Sullivan e Paulo Sérgio Valle, 1986).

Entre discos de menor voltagem e ambição artística, caso do popularesco Cantiga pra ninar meu namorado (1994), e álbuns em que o canto grave da intérprete soou com todo o brilho e expressão, casos do disco ao vivo Piano e voz (2002) e do mais recente Humana (2019), Fafá se tornou uma personalidade. Uma cantora de cabelos platinados que prescinde de ter músicas nas playlists para ser reconhecida em todo canto do Brasil como uma mulher amazônica de riso farto e identidade nacional.

Sim, Fafá transcendeu Belém – mas sem tirar a cidade natal do lado esquerdo do peito igualmente farto – e se tornou a voz de uma pessoa vitoriosa além do universo musical. Uma voz que irradia alegria a cada bom dia dado nas redes sociais, mas que também chora nas mesmas redes, vertendo nuvens de lágrimas atiçadas pela alma sentimental que faz bater o coração essencialmente brasileiro dessa artista movida a emoções, contradições e paixões ao longo dos últimos 50 anos.

O que somente torna risível e malévolo o conselho dado por Roberto Menescal a Fafá de Belém lá no início da década de 1980...

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